Os mistérios do Museu de História Natural e de Ciência da Universidade do Porto e o seu Jardim Botânico
Numa manhã da semana passada, após buscar os remédios florais na Farmácia Central do Porto, na charmosa Rua Venezuela, na Boavista (e, claro, tomar um delicioso café com empada de frango numa não menos charmosa cafetaria), estava a regressar quando passei em frente ao Museu de História Natural e Ciência da Universidade do Porto, na Rua do Campo Alegre. A meio da semana, ruas relativamente vazias no final do verão. Então, por que não fazer uma pausa e dar um passeio? (O Museu tem entrada paga, mas faço valer a minha condição de sénior!)
A visita começa pelo Jardim Botânico (entrada gratuita), onde, mais uma vez, constato a convivência portuguesa com galos que passeiam livremente nas relvas perto das alamedas. Numa área de cerca de quatro hectares, plantas, histórias e memórias do final do século XIX e da segunda metade do século XX convivem como os cedros e as araucárias, um belo roseiral, e outros jardins, com camélias a ladearem vários muros.
O Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto existe desde 2015 e tem como missão fundamental promover a construção e difusão do conhecimento sobre a evolução, diversidade e a convergência entre o mundo natural e cultural. Para tal, compromete-se a preservar, valorizar, estudar e divulgar um vasto património associado às ciências naturais, exactas e humanas, edificado através de actividades educativas e de investigação desenvolvidas na Universidade do Porto ao longo de mais de dois séculos.
Olha os galinhos aí gente! Acordem meninas e meninos!
A casa elegante, em estilo romântico, que abriga o Museu tem uma história à parte. Era a casa da Quinta do Campo Alegre, adquirida em 1895 pelo comerciante de vinho do Porto João Henrique Andresen, que a transformou para residir com a sua família. Ali nasceu a poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen, a 6 de novembro de 1919, e onde passou parte da sua infância, inspirando-a para alguns dos seus mais conhecidos contos infantis.
Uma das suas obras, “Contos Exemplares”, publicada em 1962, remete para uma referência direta, explícita no seu nome, como explica numa citação no início do livro, às “Novelas Exemplares” de Miguel de Cervantes (“é-lhes dado o nome de exemplares, e se virdes bem, não há nenhum do qual não se possa retirar um exemplo”). Em alusão ao livro de ensaios políticos publicado pelo então marido, Francisco Sousa Tavares, em 1960 (“Combate Desigual”), escreve a seguinte dedicatória: “Para o Francisco, que me ensinou a coragem e a luta do combate desigual”.
Aqui partilho um dos seus belos poemas:
Mar Sonoro
“Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho.
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim.”
Sophia foi uma das mais importantes poetisas portuguesas do século XX e a primeira mulher portuguesa a receber o Prémio Camões, em 1999, entre outros.. Falecida em 2004, o seu corpo está no Panteão Nacional desde 2014, e tem uma biblioteca com o seu nome em Loulé.
Após ter sido adquirida pelo Estado em 1949, o arquitecto paisagista alemão Franz Koepp converteu a então quinta no ambiente botânico e fez uma homenagem à poetisa no Jardim dos Anões, numa alusão ao lugar onde Isabel, a personagem principal do livro “A Floresta”, fantasiava encontrar anões.
Coelhos, um encontro estranho
Estava eu meio deslumbrada pela exposição sobre biodiversidade e eis que tenho um enorme susto! Havia um senhor sentado na penumbra que parecia admirar a coleção. Até pensei: não está assim tão frio para esse senhor de cabelos brancos estar tão agasalhado… Aproximo-me e quase peço licença para me sentar na cadeira ao seu lado e…
…É Charles Darwin, com dois coelhos grandíssimos no seu colo!
A coleção ali representada por coelhos de diferentes tipos e tamanhos ao longo dos séculos mostra a história da Ilha do Porto Santo, onde os coelhos descendem todos de um só casal, como mostra a reportagem de fevereiro de 2011 no Público, quando a exposição “A Evolução de Darwin” foi aberta.
“O objetivo era que os coelhos introduzidos em 1419 povoassem a ilha e servissem de alimento aos colonizadores. Mas a sua multiplicação foi tal que era impossível cultivar a terra. Três séculos depois, foram estudados pelo próprio Charles Darwin, pois eram muito diferentes dos coelhos europeus continentais. Ao verificar que eram mais pequenos, com uma coloração mais clara e exibindo alguns comportamentos distintos, chegou a equacionar a possibilidade de esta poder ser uma espécie diferente. Contudo, hoje sabemos, através de estudos genéticos, que o processo de especiação, embora em curso, ainda não está concluído. Ou seja, o coelho de Porto Santo, apesar das diferenças, ainda pertence à espécie europeia, e os seus diferentes tamanhos estão ali expostos na Sala da Especiação da Galeria da Biodiversidade”.
Na sala ao lado, uma enorme esfera exibe as rotas de navegadores famosos, como Vasco da Gama. Deslumbrante e muito bem elaborado.
Acompanhe a viagem de Vasco da Gama
E para encerrar, um saboroso café com pastel de nata na aconchegante cafetaria!
Os próximos posts serão de recantos do interior de São Paulo, no Brasil e … uma surpresa da História!
1 Comentário
Adorei!