Vamos passear perto da Serra da Estrela?

Conheça o responsável pelo Caminho das Indias

Tenho ido em eventos como parte de minha jornada profissional em terras lusas. E nos meus caminhos por cidades do interior, aproveito uma oportunidade de ouro para descobrir histórias e personagens.

Recentemente, estive em Covilhã para evento da AEF – Associação de Empresas Familiares na Universidade Beira Interior.

Universidade Beira Interior

A viagem de cinco horas teve uma parada para troca de autocarro em Guarda, a mais alta cidade de Portugal com 1.060 metros de altitude e próxima da Serra da Estrela. Ali, tinha duas horas para conhecer a capital do distrito da Guarda (o que seria um estado, fazendo um paralelo com o Brasil). Para dar uma noção do local, o distrito tem 712,1 km² de área e cerca de 40 mil habitantes, dos quais 26 mil residem na cidade.

Ir para o centro de Portugal também significa estar a caminho de Espanha e próximo da Serra da Estrela, com os seus picos que se cobrem de branco na época de inverno. A Guarda tem um clima privilegiado e, nas suas origens, conta com um sanatório dedicado à cura da tuberculose.

O granito marca a arquitetura da região, que é ainda famosa pelos queijos de altíssima qualidade (comprei um que mistura leites de ovelha e de vaca – uma delícia!). Pela sua posição geográfica, é ali o ponto de encontro das três bacias hidrográficas portuguesas – a da bacia do Tejo que abastece Lisboa, a Bacia do Mondego que abastece Coimbra e a bacia do Douro que abastece o Porto.

Centro de Guarda. D. Sancho I, e na região, o padrão que marca o encontro das bacias de rios

A história como sempre envolve romanos, lusitanos que preferiam cerveja ao invés de vinho!  Isso além de visigodos e da civilização islâmica. E lá vem o Brasil e seus conhecidos… O trisavô de Pedro Alvares Cabral. Álvaro Gil Cabral, entre 1383-1385 era alcaide-mor do Castelo da Guarda, e recusa-se a entregar as chaves da cidade ao rei João I de Castela. É lembrado pela coragem até hoje.

A Sé Catedral impera no centro de Guarda, com uma estátua de D.Sancho I ao lado e tem imagem em granito da padroeira Nossa Senhora da Assunção.

A Sé Catedral, imponente trabalho em granito

Berço do idioma português 

Somos mais de 220 milhões no mundo que têm o português como seu idioma materno. Embora o número varie entre os 270 milhões (Instituto Camões) e os 234 milhões e 220 milhões (sites Ethnologue e Babbel, referências na área). E tudo começou ali em Guarda. Foi nessa cidade de granito que nasceu um idioma forte e ao mesmo singelo. Em 1189: lá foi escrito o primeiro texto literário em língua portuguesa, do trovador galego Paio Soares de Taveirós para sua amada Maria Pais Ribieira, conhecida como Ribeirinha, intituladoa de Cantiga da Ribeirinha.

Essa moça chamou ainda a atenção do segundo rei de Portugal,  D. Sancho I que também se inspirou a redigir trovas reais e com quem haveria de manter uma notória relação extraconjugal, gerando numerosa descendência.

E assim, por amor a uma bela mulher — diziam-na “branca de pele, de fulvos cabelos, bonita, sedutora” — surge na Guarda a Língua Portuguesa, reflexo poderoso de paixões que os séculos não conseguiram apagar.

Guarda, uma cidade rica de amores

Covilhã, onde a arte espalha-se nas ruas 

Dali, segui para Covilhã, que é uma pérola de cidade – reúne a art street, a indústria histórica da lã e acolhe portugueses e espanhóis que se encontram na Universidade Beira Interior.

 

A chegada a Covilhã foi uma gostosa surpresa, exceto quando abri a janela do quarto e deparei-me com a torre da igreja e seu belo sino. Imediatamente pensei:

– Pronto, agora o sino vai tocar toda hora e lá sei foi meu sono recuperador de energia!

Entretanto, para minha surpresa o sino silenciou as 21 horas e retomou seus trabalhos apenas as 9 horas da manhã. Como eu voltaria apenas no sábado por conta dos horários de ônibus, teria tempo para apreciar a cidade e seus personagens históricos.

Covilhã pertence ao distrito de Castelo Branco e é a porta sul da Serra da Estrela.  Com cerca de 34 mil habitantes em seu perímetro urbano. A cidade é sede do município Covilhã que tem cerca de 47 mil habitantes. É um dos centros urbanos de maior relevo da região juntamente com cidades que ainda vou retratar em meu blog – Coimbra, Aveiro, Figueira da Foz (Viseu foi tema de post no ano passado), Castelo Branco (parada na volta para casa, mas no sábado à tarde o movimento era nenhum!).

Dia encoberto sem ser possível ver a Serra da Estrela ainda sem neve

Imigrantes acolhidos

Ali perto está o município de Fundão famoso pela cereja, pelas minas de volfrâmio e mais recentemente tem sido destaque por receber imigrantes e com eles recuperar a economia. Segundo reportagem do jornal Público, “o Fundão estendeu a mão aos imigrantes e com eles está a salvar toda a região. Ali convivem 74 nacionalidades e com um Centro para as Migrações como base, combate-se a desertificação e a falta de mão-de-obra. Partilho a matéria publicada em 11 de maio desse ano. Afinal, como se tornou o Fundão um modelo de integração?

Covilhã é a terra da indústria da lã, berço de descobridores de quinhentos, e hoje movimentada por estudantes portugueses e espanhóis que frequentam a Universidade Beira Interior.  

A história da lã retratada no Museu de Covilhã

As muralhas de seu primitivo castelo foram erguidas a mando do monarca D. Sancho I . Mais tarde, o rei D. Dinis  mandou construir as muralhas do admirável bairro medieval das Portas do Sol.

Lá foi o berço de grandes figuras determinantes para os grandes Descobrimentos dos séculos XV e XVI: o avanço no Oceano Atlântico, o caminho marítimo para a Índia, as descobertas da América e do Brasil, a primeira viagem de circum-navegação da Terra.

Viveu épocas de expansão populacional e relevância na agricultura, pastorícia (criação, manutenção e utilização de animais como camelos, cabras, gado). O Infante D. Henrique, também foi o “senhor” da Covilhã. A gestão para os descobrimentos exigia verbas avultadas e além de impostos, as pessoas da região trabalhavam nessa saga. Tudo começou com a conquista de Ceuta em 1415 com a participação do Frei Diogo Alves da Cunha, cujo túmulo está na Igreja da Conceição.

Mas é Pêro da Covilhã  quem encanta pelo seu papel no caminho para a Índia. Foi o primeiro português a pisar nas terras de Moçambique, a enviar notícias a D. João II e sugerir estratégias para atingir os distantes produtores das especiarias orientais. Depois de sua terceira excursão paga pelo rei em que faz o mapeamento para a futura viagem de Vasco da Gama, decide não mais retornar.

Pero de Covilhã e suas viagens

O passeio começa na Praça do Município e mistura prédios centenários com a arte na rua. Ali estão algumas obras do arquitecto Mateus Fernandes, autor do projecto da porta de entrada para as Capelas imperfeitas, no mosteiro da Batalha (lugar que vale a pena visitar!).

A cada esquina, uma arte e uma história

E ao caminhar pelas estreitas ruas, deparo-me com a Redacção do jornal Notícias da Covilhã. O jornal tem uma edição semanal que focaliza o eixo Guarda – Covilhã – Fundão – Castelo Branco e está no ano 111 – isso mesmo, é mais que centenário! As notícias são atualizadas diariamente nas redes sociais e a equipe é formada pelo diretor Francisco Figueiredo, os jornalistas Ana Ribeiro Rodrigues e João Alves, além dos profissionais de paginação e designer. Conta ainda com vários colaboradores e correspondentes nas cidades próximas.

A vista da Serra da Estrela e dos cantos e recantos de Covilhã deve ser apreciada pela ponte pedonal sobre a Ribeira da Carpinteira (larga o suficiente para dar coragem aos que têm medo de alturas). Projectada pelo arquitecto minimalista João Luís Carrilho da Graça, faz um caminho de 220 metros em ziguezague muito acima do vale da ribeira da Carpinteira e é uma das pontes pedonais mais impressionantes de Portugal. Foi reconhecida em vários prêmios internacionais de arquitetura e design.

A arqueologia industrial é integrada por muitos edifícios em ruínas como a Real Fábrica dos Panos criada pelo Marquês de Pombal em 1763 que agora é sede da Universidade da Beira Interior. Vale visitar o Museu de Covilhã que conta a história da cidade e foi reconhecido como um dos museus mais inclusivos de Portugal. Em quatro andares, percorre-se a história acessível a deficientes visuais e auditivos. Vale ainda conhecer o Museu de Lanifícios, considerado o melhor núcleo museológico desta indústria na Europa.

A Universidade Beira Interior que anteriormente abrigada lanifícios.

A cidade recebe há 11 anos o WOOL Covilhã Arte Urbana em que os artistas combinam dimensões diversas como território, memória, identidade, tecnologia, comunidade. A edição de 2024 buscou a transformação do território e da comunidade através da arte.

No Museu de Covilhã, é possível ainda enviar para seu e-mail o texto que estás a ler.

 

Covilhã conheceu o ápice e a queda na indústria de lãs. Mas como tantos recantos portugueses, ela se reinventou. Então, vale ainda fazer a rota da lã. Ainda não fiz, mas aguardem, pois, retornarei para pesquisar mais sobre esse fantástico Pero de Covilhã, que merece uma história própria digna de um romance!   

Em cada curva do autocarro, tem um belo visual.

Lena Miessva

Jornalista & Escritora & Blogger

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Olá, Sou Lena Miessva

Após percorrer várias estradas da vida no Brasil, Lena Miessva inicia um novo caminho em Portugal. Aprendizados nas relações humanas, na comunicação interpessoal e aprimoramento da escrita são seus focos principais nesses tempos de mudanças globais, locais e pessoais.

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